glossário do esquema conceitual do possível serdual - cansaço

Cansaço

“Alheio a estes argumentos apresentados até aqui, o filósofo sul-coreano Byung-Chul Han (1959 –), argumentou competentemente, ao escrever em seu livro “Sociedade do cansaço” que «a sociedade disciplinar de Foucault[1], feita de hospitais, asilos, presídios, quartéis e fábricas, não é mais a sociedade de hoje. Em seu lugar, há muito tempo, entrou uma outra sociedade, a saber, uma sociedade de academias de fitness, prédios de escritórios, bancos, aeroportos, shopping centers e laboratórios de genética. A sociedade do século XXI não é mais a sociedade disciplinar, mas uma sociedade de desempenho. Também seus habitantes não se chamam mais “sujeitos da obediência”, mas sujeitos de desempenho e produção. São empresários de si mesmos».

E ele atribui a um excesso de positividade a raiz de todos os principais problemas individuais atualmente encontrados no sujeito, como a depressão, por exemplo. A questão é que ocorre mesmo que a busca pelo desempenho é tão profundamente enraizada em cada um que é mesmo forte a crença de que tudo o que pode ser feito, que o topo é mesmo logo ali e completamente acessível, e tudo isto será dado pela capacidade única que cada um tem consigo mesmo. Aprofundaram-se em nossa contemporaneidade as crenças acerca da própria autonomia e capacidades humanas.

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E isso faz estragos quando a depressão «… irrompe quando o sujeito de desempenho não pode mais poder. Ela é de princípio um cansaço de fazer e de poder. A lamúria do indivíduo depressivo de que nada é possível só se torna possível numa sociedade que crê que nada é impossível». Mas, devido à transferência da propriedade da responsabilidade de agência para o sujeito, este passou a acreditar que para ele nada deveria ser impossível também. E o choque do sujeito com a realidade e as impossibilidades que esta contém, indiferente do que o sujeito acredita ser capaz ou não, o leva à inconformidade com esta realidade inflexível, e o leva ao cansaço, à depressão, e a outros males ainda piores. Tal quando a criança descobre a verdade sobre o mundo, que não é um conto de fadas, e frustra-se consigo mesma, a se culpar.

Há, ainda, nos argumentos de Han que a busca pelas possibilidades esteja presente nesta «mudança de paradigma da sociedade disciplinar para a sociedade de desempenho», pois «aponta para a continuidade de um nível. Já habita, naturalmente, o inconsciente social, o desejo de maximizar a produção». E, por isso, podemos perceber que a maximização da produção é apenas uma das formas que levará às possibilidades, mas não a única. Mas, indubitavelmente, produzir é ofertar mais, variar mais, em uma época em que se produz primeiro para provocar o desejo, ao criar-se a demanda artificial com base nos desejos provocados. Não há risco, pois sempre a provocação do desejo acaba por ser certeira, dado que todos os desejantes estão docilmente preparados para serem excitados a consumirem mais e mais. Um ciclo perverso, e possivelmente desnecessário.” (em O Guia Cínico e Selvagem dos Jogos da Vida, Cap. VII)


[1] Filósofo francês (1926 – 1984)

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