glossário do esquema conceitual do possível serdual - ideologia

Ideologia

Ideologia: “Se há, de facto, a partir de tudo o que foi descrito até aqui, algumas argumentações que parecem corroborar com a suposição da existência e a capacidade de influência de um espírito obsessor, tal qual entidade transcendental considerada capaz de dirigir as ações e conteúdos dos sujeitos em conformidade aos propósitos de uma ordenação estabelecida por uma dada forma, então se faz necessário conhecer mais sobre esta fenomenal entidade. Mas, se você ainda resiste duramente a tal hipótese espiritual, há uma nova abordagem acerca dela que lhe parecerá mais apropriada e conveniente. Vamos a ela.

A “comunicação” direta com todos os alegados espíritos dos mortos – seja pelo diálogo objetivo, seja por via de cartas ou postais, ou até mesmo através dos meios digitais, desde o telex, a passar pelo fax, e-mails ou redes sociais, ao menos até hoje, foi impossível de se evidenciar com algum grau de assertividade racional e factual.

A comunicação indireta, que se dá pelo uso de intermediários, ou médiuns, nunca conseguiu ser validada totalmente, a nível epistemológico e ontológico com um grau mínimo de assertividade – embora muitos consideram existir tais comunicações, mas somente no campo da fé, do conforto necessário que buscam, mas sem uma comprovação como devemos exigir e prezar. Por isso, também assim não nos será conveniente.

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Pois, em nosso caso, comunicarmo-nos assim com o nosso espírito obsessor estrutural será até subversivamente problemático, e isso se dará não por não haver a facilidade de fazê-lo “baixar” em alguém disposto a ser o médium comunicante, para que através deste procedimento mediúnico possamos “dialogar e arguir” o espírito obsessor. Há muita facilidade para encontrarmos um médium para que isto ocorra, e é tanta, mas tanta facilidade e serão tantos os voluntários que o problema ocorre justamente por isso, pois todos os viventes já estão a atuar como médium deste espírito, em maior ou menor grau, e isto colocaria a arguição em imediata suspeição, pois será completamente contaminada.

Mesmo que não tenhamos a necessidade do tal ritual mediúnico, algo muito incomum já estaria a ocorrer, ao termos respostas divergentes para uma mesma pergunta feita sobre “ele” – uns médiuns até negam que “ele” exista mesmo, enquanto outros se dizem devotos fervorosos, e alguns possuem certezas que “ele” aparece para eles e conversam sempre sobre tudo – e todos já estariam assim a falar pelo espírito, ou a negar sua própria existência ou a exaltá-la. Por isso, pela forma com que cada médium o percebe e o expressa, fica impossível identificar a verdade nas comunicações sem considerarmos uma multipolaridade no espírito – mas “ele é” perfeito e por isso mais impossível ainda. Mas mais impossível ainda do que este último mais impossível ainda será pensar em alguma despossessão coletiva ou mesmo em um exorcismo individual para uma libertação completa, se é que isto seja possível, viável ou necessário.

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Esta influência espiritual obsessiva, assim suposta, parece ocorrer mesmo que a racionalidade nem sempre se faça presente, ou manifestada, ou utilizada. Não é necessariamente uma influência objetiva, argumentativa, construtiva, uniforme, consistente e autônoma, e, portanto, necessariamente racional, como seria o suposto inteligentíssimo espírito hegeliano da razão, mas também não se dá de forma necessariamente subjetiva ou irracional, de todo, pois não é nada animalizada, mas sim uma influência aparentemente arracional, tal qual um condicionamento, vício ou hábito, na qual se faz relativamente o que “ele” espera que se faça, sem que “ele” se expresse diretamente, e tudo dentro de um automatismo comportamental que por ser tão evidente, ficou normalizado, e quase devocional.

Há uma relação tão profunda como aquelas em que se formam modos de comunicação apenas pelos olhares, pelos gestos, pelas circunstâncias. A palavra “ele” ficou entre aspas, pois, de facto, não há a pessoalidade no que é “ele”, pois não há uma existência autônoma ou deliberativa deste espírito dotada de uma personalidade, conforme veremos. Pois, aqui, estamos a usar o pronome pessoal a se referir a algo não exatamente pessoal, e dispensaremos as aspas, doravante. Assim, os céticos em espíritos fenomenológicos já ficam mais confortáveis. E os mais crentes na transcendência podem continuar certeiros que ainda há algo para além das aparências, como sempre suspeitaram, ainda que não da forma que estiveram a pensar. E todos ficam felizes, ou não.”

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“É como um espelho “mágico” com capacidade de causar alterações na imagem refletida, ainda que nem sempre o faça, pois também pode refletir a imagem sem nenhuma alteração, ainda que raramente. Pois, como não se sabe o que se está a emitir, exatamente, também não se saberá o que se estará a receber, e não se conseguirá perceber a diferença, e nem se fazer juízo acerca dela. Por isso, em síntese, toma-se a representação como a realidade. A imagem percebida, de si e do mundo, passa a ser tomada como a própria realidade. Essa diferença é que faz com que a soma das partes (reais) sejam sempre menores do que o todo (composto também pelas representações). Aos poucos, estamos a construir as bases funcionais desta entidade.”

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“Por isso, o espírito pode aparentar ter uma razão mais rudimentar ou até muito sofisticada, mas serão apenas aparências, ilusões, e a forma como se percebe ele só dependerá de quem está a buscar usá-lo, a desejar afirmações e conformidades, pois é uma razão, ainda que aparente, que surge não apenas como causa, mas como efeito, na mesma velha e funcional causação imanente, quando a causa é também o efeito, em si mesma.

Esta aparente confusão de se perceber sobre a racionalidade do espírito – e por consequência atribuir a ele uma consciência, uma existência autônoma – acontece porque este é composto basicamente pelos conteúdos compartilhados e comuns, em seu núcleo, que estão distribuídos e rodeados conforme suas predicações, das mais comuns, densas e duais, mais ao centro, e ao redor estarão as mais específicas, sutis e isoladas, mais à superfície. Pense que se o mundo iniciasse hoje, com uma única rede social e que todos tivessem acesso a elas, então a primeira fotografia publicada ficaria disponível para todos. Logo, alguém publica novamente a mesma fotografia, mas com filtros aplicados.

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E há a diferença, e há a predicação – uma será mais do que a outra, e outra será menos do que uma… e, assim, sem que se alterasse o conteúdo, se alterariam suas predicações e, portanto, faz parecer que há “mais” do que havia. Todas estas predicações passam a operar como diretrizes dos conteúdos que possibilitam os fluxos entre eles, as mudanças de posições, e que os alocam onde estão, e por isso são confundidas com o próprio espírito, que parece sempre crescer em dimensão, e em importância, para além da mobilidade que se consegue perceber nele, sempre a fluir por tudo o que se conhece.

E o espírito parece ser a totalidade dos conteúdos e predicações, das formas, e que está presente por toda a estrutura, desde as crenças mais profundas, como os valores do bem e do mal, até chegar ao nível das possibilidades, que é o limite de sua atuação – e também da nossa.

Portanto, a atuação do espírito também estará presente nas regras, e nas ações dos seus representantes com os quais nos relacionamos, o que justifica o papel ordenador que será atribuído a este espírito, que dá também os critérios das predicações serem como são, e por isso há a impressão de sua constante presença, como sempre estivesse a nos observar, e sempre disponível, até mesmo capaz de intervir intempestivamente se contrariado e, assim, dotado de uma personificação; e é por isso que se atribui intuitivamente a “ele” um tratamento pessoal, ou mesmo um nome, ou uma posição ontológica, talvez divina,  pois passa a ser percebido como se tivesse imensa capacidade racional.” (em O Guia Cínico e Selvagem dos Jogos da Vida, Cap. XV)

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A ideologia é instanciada, em perspetiva, a partir das possibilidades – criadas por nós em nossas redes relacionais. São estas relações que ativamente provocam o senso criativo dos indivíduos, que percebem suas faltas e intencionalmente fazem evoluir as possibilidades, a correlacionarem valores morais. A falta percebida provoca a necessidade de superação das próprias limitações, da finitude, e estimula a vantajosa vida em sociedade, mas não apenas isso. Por crer que seja possível ainda mais do que apenas anular a diferença negativa que possui, passa-se a buscar este mais. E o mais é feito ao criá-las e recriá-las: as possibilidades mais ambicionadas e valorosas, e isto levou à formação e consolidação das relações estruturais. Tais relações possuem as mesmas origens na ideologia e na moral mais primitivas, mais “puras”, e que logo passaram a constituir relacionamentos regulados e parametrizados.” (em O Guia Cínico e Selvagem dos Jogos da Vida, Cap. XVI)

Ideologia: Conteúdo Protegido.

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