glossário do esquema conceitual do possível serdual - Quantitativos x Qualitativos

Quantitativos x Qualitativos

Falta-nos novas questões correlatas aos problemas dos quantitativos x qualitativos, eis algumas.

Como buscar o conhecimento a partir de um todo que não existe para além de uma possibilidade de universalidade, realmente?

Qual é este verdadeiro transcendente universal que ainda insistem em perseguir?

Eis a questão bilionária: conhecer este verdadeiro transcendente universal é o desejo de todos os devotos que defendem a universalidade.

Quantitativos x Qualitativos

Se, quantitativamente, digamos, cinquenta pessoas ingressem em um mesmo clube (seja o de sexo livre e selvagem ou o de leitura filosófica medieval) e, portanto, isto significa que todas aceitam as regras vigentes no clube. Destas cinquenta pessoas, formaram-se, naturalmente, pelos relacionamentos criados, oito grupos, com seis a sete pessoas, na média, em cada um destes, conforme seus interesses e afinidades. E, dentro destes grupos, diferentes posições são formadas, algumas mais ativas, outras mais passivas, e tudo fluiu para que cada um possa obter o que sempre quis ali: atingirem as suas próprias objetividade e subjetividade. E isto será o próprio Universo de cada individualidade, não fixo, nem limitado e nem imutável, mas sim uma dimensão qualitativa, dinâmica e excitante. Obviamente, também com quantidades, ou intensidades.

Considerar o Universo como um todo a se expandir nos dá a impressão de uma certa ordem, de um padrão de movimento que a Física Teórica ou a Astronomia buscam tanto descobrir, e com muitos avanços, mas também há o “vazio” em muitos espaços, que é uma forma de perceber que os corpos se organizam em galáxias e cada uma delas é distinta das outras, em vários sistemas que estão dentro destas e assim, sucessivamente. Olhamos para o céu, em uma noite inspiradora, e tendemos a pensar na infinidade de estrelas que existem como se fossem todas próximas e conectadas a um único sistema diretor de tudo o que há.

Quantitativos x Qualitativos

Mas, nenhuma é exatamente igual à outra, e muitas já nem existem mais. A infinidade é pensada, apenas, na quantidade, mas nunca na qualidade e assim fomos sempre ensinados e educados. Aprendemos a pensar condicionadamente de forma a construir conceitualmente uma universalmente que não é óbvia à priori, e tudo isso sem considerar a infinidade das qualidades, sem perceber mesmo a diferença como o elemento-chave de nossa perspetiva existencial.

O que isto que dizer na prática? Percebamos esta outra questão: «refugiados são indesejados?». Quem escuta uma pergunta desta deveria responder com outra pergunta, necessariamente: «são indesejados como, em quantidade ou em qualidade?». Mas é uma pergunta que não é feita, pois ninguém as conhece. E assume que seja sempre apenas em quantidade, e nunca em qualidade. Assim, intuitivamente e automaticamente sempre o ouvinte arguido perceberá a frase como «refugiados em grandes números são indesejados?». E o excesso é geralmente um problema, em quase tudo, e por isso sempre considerará que refugiados serão problemáticos para o seu “universo” em questão. E sabemos o resultado deste ciclo.

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Nada, aliás, como temos visto, é inocente. Sempre há um certo propósito e um incerto despropósito em todas as questões. Por isso, pelo lado prático, pensar universalmente tem seus efeitos nocivos em tantos outros aspetos. Os mais idealistas devotos dirão: «mas são coisas diferentes que não podem estar no mesmo balaio». Se são coisas diferentes? Sim, com certeza, pois tudo é diferente. E este é exatamente o ponto que se está a buscar esclarecer! E não há mesmo um balaio com tudo dentro. São muitos os balaios, e precisamos percebê-los assim, sempre em perspetiva, um a um – e isto dá trabalho e incertezas, por isso criam-se resistências para tal.

Passar de um quantitativo para um qualitativo foi um passo dado por Hegel[1], e muito acertado. Mas ele expressou filosoficamente sua obsessão oculta, e bem obscena, de legitimar conceitualmente o todo, que é uma necessidade implícita (e suficiente) para todos que aspiram ser idealistas, e assim logo buscou fazer o caminho inverso, de passar da qualidade para a quantidade. Do movimento e da heterogeneidade para a paralisia e a homogeneidade, segundo as conceituações bergsonianas[2].

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Nunca dá certo, mas é sempre um esforço que nunca para de ser feito pelos devotos buscadores da universalidade. Talvez com a impressão de que seja possível atingir uma universalidade por aí, pela busca do movimento dentro do que não se move, do que é morto, como são os números.  Mas, o fluxo de ida e de volta, entre qualidade e quantidade, se consistentemente realizado, chega a um ponto mediano, condensado, clusterizado, e que pode dar uma impressão de ser isto a universalidade. Muitos gostam deste estado transitório e se acham realizados, se dão por satisfeitos, ainda que por alguns instantes antes de as contradições e inconsistências ressurgirem mais fortes.(em O Guia Cínico e Selvagem dos Jogos da Vida, Cap. X)


Notas – Quantitativos x Qualitativos

[1] «Grandeza extensiva e intensiva são, portanto, uma e a mesma determinidade do quantum; elas são diferentes apenas pelo fato de que uma tem o valor numérico como dentro de si, e a outra tem o mesmo, o valor numérico, como fora dela. A grandeza extensiva passa para a grandeza intensiva, porque seu múltiplo desaba em e para si na unidade, fora da qual ocorre o múltiplo… Assim, a grandeza intensiva é também essencialmente grandeza extensiva. Com essa identidade entra o algo qualitativo.». Em HEGEL, G. W. F. Ciência da lógica. A Doutrina do Ser. Petrópolis: Vozes, 2016, pg. 235

[2] Bergson percebe a nossa forma platônica de pensarmos sobre a paralisação do movimento para compreendermos as coisas: «em certo sentido, todos nascemos platônicos», mas o faz de forma crítica, a perceber que já passou da hora de não sermos assim, de abraçarmos o movimento como algo que precisa ser compreendido filosoficamente, ao criticar Kant «toda a crítica da razão pura repousa também sobre o postulado de que nosso entendimento é incapaz de qualquer outra coisa a não ser platonizar, isto é, modelar toda experiência possível em moldes preexistentes». ROSSETTI, Regina. Movimento e Totalidade em Bergson – A Essência Imanente da Realidade Movente. Coleção Ensaios de Cultura. São Paulo, SP – EDUSP, 2004, pg. 55 e 56.

Quantitativos x Qualitativos: Conteúdo Protegido.

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