glossário do esquema conceitual do possível serdual - universo

Universo

“Mas, primeiro, o que é o Universo? E por qual razão este não poderia ter qualidades extensivas a tudo o que se encerra nele, ou nele próprio? Basicamente por ser o Universo um apanhado de coisas “aleatórias” em constante transformação, um conjunto de matéria e energia, que o físico alemão Albert Einstein (1879 – 1955) nos disse que são teoricamente a mesma coisa, mas não percetivamente, pois o Universo é um conjunto instável e heterogêneo, imprevisível e, quiçá, talvez também com mau feitio, se atribuíssemos também a “ele” uma personalidade humanizada, como muitos tentam fazer.

Pois há quem o faça, misticamente, ao atribuir ao Universo uma inteligência ativa e interventora nas vidas humanas particulares, a considerá-lo interativo com desejos e necessidades particulares. Olhar para o firmamento, para as estrelas, possui um significa introspetivo que reafirma tal possibilidade interativa, em algum nível. A mente humana, que é capaz de ver rostos santos em torradas velhas, nunca se privaria de sacralizar o “todo” existente, se isto lhe for conveniente. O prefixo “uni” é o que confunde muito, já à partida, a partir de uma unidade que é meramente artificial, fundada na linguagem, ou nominalista.

O Universo, enfim, está definido pelos dicionários como o “conjunto de todas as realidades criadas” ou o “conjunto de quanto existe”, ou “o mundo” ou ainda “o todo; inteiro”. Tais definições passam a assumir, necessariamente, uma instância cosmológica, astronômica e delineada por dimensões espaciotemporais do Universo como conjunto de tudo o que há, do que conhecemos e também do que podemos conceber existir. Assim, em algum momento da História da suposta Humanidade, surgiu uma pergunta considerada necessária para o saber acerca do Universo, ainda não respondida de todo, que é perceber a origem deste “tudo o que há”, a matriz, o que (ou quem, para outros) está a produzir primordialmente este conjunto cósmico.

Logo apareceram as observações dos fenômenos meteorológicos, dos ciclos do dia e da noite, das estações do ano, etc.; depois vieram as teorias mitológicas; depois as considerações filosóficas pré-socráticas, acerca dos elementos, um a um – a água eleita por Tales de Mileto, a terra eleita por Xenófanes, o fogo eleito por Heráclito e o ar eleito por Anaxímenes, não necessariamente nesta ordem ou separadamente, mas apenas para a destacar a relevância da busca pela origem, na aposta inicial em um ou mais dos elementos primordiais; e logo veio Platão com o éter, com o seu Demiurgo e as ideias suprassensíveis; Aristóteles com o motor imóvel que fazia a tudo se mover em sua direção e sua hipótese de “incriação”, da eternidade do todo e sempre, também etérica; mas tudo se desenvolveu ainda mais e depois veio o Uno de Plotino que se excedia a si mesmo a ampliar as dimensões existentes; e, em sequência de relevância, com a teoria do Uno romantizada com pitadas de terror, surgiu a Teoria da Criação Divina, em que deus criou o Universo, ou os deuses, ou a dualidade, ou alguma outra origem metafísica ou sagrada.

E tudo sempre girou na busca de um elemento que dá origem a tudo, que sempre foi uma preocupação real e relevante, que não se encerrou, pois recentemente, em 2013, foi descoberto o Bóson de Higgs, uma partícula subatômica que foi logo chamada de “partícula de deus”, tal o desejo de se fazer imanente o que seja transcendente.

Podemos perceber o comportamento coletivo que levou à justa comoção mais recente, ao vermos as imagens de altíssima qualidade feitas pelo novo telescópio espacial James Webb, a tentar fotografar ainda os resquícios luminosos do que imaginamos ter sido o Big Bang, e trazer uma explicação ou registo sobre a origem primeira de tudo, e talvez apareça um dedo de deus a estoirar algo, tal como um milho que se transforma em pipoca quando aquecido. Isto nos fascina, nos prende a atenção, nos comove e nos leva a sempre desejar mais e mais do que nos pode levar às origens de tudo. E é assim que somos, desde sempre, em relação às origens supostas, pois é muito mais fácil perceber sobre a “origem” do que sobre o “destino”, se é que existem tais conceitos causais ou instanciais válidos em relação à existência deste “todo” que insistimos em legitimar, enquanto humanos.”

“Mas, e se especulássemos um pouco mais sobre o que ainda não se conhece?

Como vimos, uma definição aceitável para o Universo, como conjunto, é a concentração nele de todos os espaços e todos os tempos, para além da matéria ou energia que existe inserido neste conjunto. Há a matéria e a energia, na versão “convencional”, mas há também a energia e a matéria escura, em que estas últimas são consideradas teoricamente como a maior parte do Universo suposto ser “conhecido”, embora sejam estas duas componentes completamente desconhecidas.

O conceito “escuro”, ou dark, em inglês, aqui se refere justamente à incapacidade de se ver e, portanto, de se conhecer sensivelmente ou por meios de aparelhos específicos. Até hoje não foi impossível apreender na atualidade nem a matéria nem a energia escura, embora tenham sido ambas funcionalmente teorizadas e tidas como reais, ao menos no campo da Física Teórica, que nem sempre acaba por provar muitas de suas teorizações. A maior parte do Universo, literalmente, é conhecida apenas pela teoria, pela nobre e necessária elucubração científica sem a atualidade kantiana.

Há tanta coisa que há. E não há tanta coisa que não há. Mas também passa a haver coisas que nunca param de ser descobertas com o avanço das investigações científicas. O facto é que temos, na realidade, uma vaga noção do que existe no Universo, e uma suspeita certeza de que haverá como descobrir mais, no amanhã, pois o amanhã é ele próprio uma outra suspeita oriunda da certeza indutiva. E a isso chamamos de todo, como sujeito, e o eternizamos e universalizamos, predicativamente, antes mesmo que possa a vir ocorrer.

O Universo é somente aquilo que conhecemos e que supomos existir, com o acréscimo de nossas crenças e desejos, vontades e intenções, tudo representado metafisicamente em nossa mente por algo transcendente que parece ordenar o caos, e nada mais para além disso. Somos, em última instância, torcedores do time do amanhã e devotos das nossas origens desconhecidas.” (em O Guia Cínico e Selvagem dos Jogos da Vida, Cap. XIII)

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