glossário do esquema conceitual do possível serdual - vida dupla

Vida Dupla

“Sobre a vida dupla e afins: Ainda que toda obsessão seja um relacionamento, nem sempre todo relacionamento é consensual. Mas, neste caso, o relacionamento com a ideologia é mesmo consensual, descarado e obsceno. E que pode até ser mesmo erótico, de tão tórrido que poderá vir a se tornar. E esta consensualidade pode ser limitada ou condicional, ou até mesmo incondicional e ilimitada, a atingir um nível radical de submissão, quando extremada. Mesmo que seja considerada uma relação extrema ou “estranha”, só é assim considerada pelos que estejam de fora dela. Pois estes não conhecem as verdadeiras razões estabelecidas entre seus participantes, pois faltam-lhes os conteúdos e os valores deles.

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Assim a rede relacional existente é percebida como esdrúxula, como acontecem com muitas relações existentes que sejam consideradas até “anormais”, quando classificadas pelos sujeitos “normais”. Como, por exemplo, podemos citar quem passa a observar cruamente o que ocorre entre tais posições assumidas em relações de poder, trabalho ou prazer. Casos clássicos quando consensualmente uma parte seja dominadora e a outra seja a dominada.  São casos corriqueiros, como no caso das seitas e religiões, das tramas feitas pelos puxas-sacos corporativos, ou também nas relações sadomasoquistas entre chicotes e algemas. Sempre observamos relações que para nós são estranhíssimas, e nos parecem abusivas, por vezes. Mas nos falta a perspetiva do outro, e o nosso juízo fica a nos pregar uma peça.

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E é isto o que verdadeiramente “legitima” os relacionamentos que julgamos ser aparentemente extremos entre dominador e dominado. Pois, se há consensualidade entre estes, será sempre um relacionamento com base na ideologia predominante que estes comungam entre si. E ponto. Havendo consentimento consensual, há licitude. E, portanto, há algum acordo em relação ao que ocorre entre ambos, a princípio. Se não há consensualidade, não será um relacionamento em que ambos estejam na mesma ideologia e, portanto, não é algo ideologicamente estabelecido entre as partes. E assim, e só assim, poderá haver algo delituoso de uma parte em relação à outra.

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Há ideologia até mesmo entre um casal. Pois se há a estrutura formada, há também uma ideologia formada que ficará mais profunda quanto maior for a duração e a intensidade da relação. Ao sedimentarem-se progressivamente os valores compartidos e comprometimentos firmados, a relação se aprofundará mais e mais. No extremo da profundidade, o casal parece ser uma unidade, sem mais individualidades.

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Há, ainda, e não poderíamos deixar de citá-los, os relacionamentos que possam ser considerados aparentemente “normais” para um observador externo, mas que não sejam consensuais. Pois sempre há nestes alguma dissimulação das partes, a atenderem a alguma outra ideologia que não a do casal, propriamente. E que este, a bem da verdade, não está a se relacionar, mas sim a cumprir algum papel imposto para si. Quantos casais não passam a construir uma vida dupla, separadamente do outro? E por que o fazem? Qual o sentido de manterem as aparências a tal custo de uma privação pessoal? Fazem isto justamente por ela: a ideologia à qual estão a atenderem e a nutrirem.” (em O Guia Cínico e Selvagem dos Jogos da Vida, Cap. XVI)

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